quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

GRANDES CLÁSSICOS - FLUMINENSE X BANGU - 1964


Diante da recém-terminada Taça Guanabara, que consagrou o Fluminense como Campeão e deixou o Bangu como lanterninha sem sequer um mísero ponto conquistado, muitos podem duvidar que, em um passado nem tão distante, o Alvirrubro de Moça Bonita protagonizava com o Tricolor das Laranjeiras embates do mais alto nível. Um deles ocorreu no ano de 1964, para onde ofereço aos amigos uma viagem em primeira classe nas linhas abaixo.


Tão difícil quanto ganhar na Mega-Sena era apontar um favorito absoluto nos Campeonatos Cariocas da época em que o Brasil não incluía seus craques de futebol nos produtos tipo exportação. Para o Cariocão de 1964 eram nada menos do que seis os times que poderiam levantar o caneco sem que alguém pudesse gritar “Que zebra!!!”. Porém, com o desenrolar do torneio, o Vasco, que em alguns momentos apresentou a dupla de zaga Brito e Fontana, futuramente Campeões do Mundo com a Seleção Brasileira em 1970, e o América, que tinha Zizinho, o “Mestre Ziza”, como treinador, ficaram pelo meio do caminho. Restaram, então, Bangu, Botafogo, Flamengo e Fluminense, em ordem alfabética, como postulantes ao título.


O Flamengo, que brigava pelo Bi, tinha no lendário técnico Flávio Costa, dono da marca de oito títulos estaduais no currículo – cinco pelo Fla (39, 42, 43, 44 e 63) e três pelo Vasco (47, 49 e 50) – uma de suas principais armas. Dentro das quatro linhas, o destaque rubro-negro ficava por conta de Carlinhos, um meio-campo de tamanha classe e elegância no trato do couro que receberia o apelido de “Violino”. Pegando a condução da Gávea para General Severiano, o Botafogo apresentava um onze que misturava estrelas do inesquecível esquadrão Bi-Campeão em 61/62 – Manga, Nilton Santos, Rildo, Didi, Quarentinha, Zagallo e até Garrincha, no 1º turno – com as da geração que repetiria o Bi em 67/68, como Gérson, Jairzinho e Roberto Miranda. Vamos e venhamos: estes nomes alvinegros não necessitam de adjetivos, né?


Porém, em um campeonato mais equilibrado que trapezista do Cirque du Soleil, o clichê “todo jogo é uma decisão” é válido. Assim, tropeços do Botafogo em duelos contra os times da parte inferior da tabela e derrotas do Flamengo nas brigas entre os cachorros grandes deixaram ambos empatados e apenas um pontinho atrás dos protagonistas do Cariocão de 1964: Bangu e Fluminense. Lembrando que na época a vitória valia dois pontos, Flu e Bangu terminaram os dois turnos empatados com 35 pontos e no topo da tabela. Assim, o destino do troféu seria decidido em uma melhor de três.


Com uma campanha de somente duas derrotas em 24 jogos, o Bangu começava a montar, neste 1964, aquele que se tornaria um dos times mais lembrados do futebol carioca e conquistaria, dois anos depois, em 1966, o título Estadual. Do goleiro, o ágil Ubirajara, ao ponta-esquerda, o Alvirrubro era recheado de cracaços. Fidélis, o “Touro Sentado”, lateral-direito dono de um preparo físico invejável até para os dias de hoje, e a dupla de meio-campo formada por Ocimar e Roberto Pinto são nomes que espelham a qualidade banguense. Porém, a grande força alvirrubra estava em seu ataque. E que ataque! Na ponta-direita, Paulo Borges fazia de tudo e mais um pouco. Veloz e letal, infernizava as retaguardas adversárias e era daqueles que não precisavam de mapas para encontrar o caminho do gol. Se os dez que marcou neste torneio de 64 não foram suficientes para lhe dar o prêmio de artilheiro – esta honra caberia a um outro devoto do gol, de quem falaremos linhas abaixo – no biênio 66/67 ninguém tiraria Paulo Borges do topo da tabela de goleadores do Estadual.


E não era só o “Gazela”, apelido de Paulo Borges, quem sabia balançar as redes. Juntos, no comando do ataque suburbano, a dupla formada por Parada e Bianchini foi responsável por nada menos do que 25 dos 47 gols da equipe, ou seja, mais do que 50% dos tentos. Para fechar o poderoso ataque, Aladim – que mais tarde também faria história no Coritiba, com a conquista de seis Paranaenses – Cabralzinho e Canhoto se revezaram durante a competição.


“Mas para vencer um Bangu como esse o Fluminense necessitaria de um time de 24 quilates!” – deve estar pensando o amigo. Pois bem, o Fluzão-1964 era, realmente, 100% ouro. Se diz o ditado que todo grande time começa com um grande goleiro, a camisa 1 do Tricolor era vestida por ninguém menos do que Carlos Castilho, o “Leiteria”, goleiro de quatro Copas do Mundo no currículo (além de 50 e 54, foi Bi em 58 e 62) e que aliava uma extraordinária qualidade debaixo das traves com uma sorte que só acompanha os gigantes. À frente de Castilho, o Flu contava com uma dupla de zaga de impor respeito a qualquer ousada e atrevida linha de ataque: o já ídolo tricolor Altair, Campeão do Mundo em 1962 que quando atuou na lateral-esquerda ganhou o status de melhor marcador de Garrincha, e Procópio.


Procópio, assim como o meia Oldair e o atacante Evaldo, todos nomes essenciais neste Flu-64, se tornariam, em poucos anos, nomes históricos do futebol mineiro. O sólido Procópio e o goleador nato Evaldo fizeram parte do maior Cruzeiro de todos os tempos, o de 1966, que venceria a Taça Brasil com duas vitórias inimagináveis sobre o Santos de Pelé: 6 x 2 no Mineirão e 3 x 2, de virada, na Vila Belmiro. Procópio também entrou para a galeria de grandes do Atlético Mineiro pelo que fez dentro de campo e, principalmente, fora de campo, sendo o segundo treinador que mais vezes comandou o clube. Falando no “Galo”, muitos dizem que se não fosse Oldair o Alvinegro Mineiro não teria conquistado o Campeonato Brasileiro de 1971. Como lateral-esquerdo e capitão do time, Oldair marcou, contra o São Paulo, no Morumbi, o gol da vitória do Atlético por 1 x 0. Vitória esta ocorrida na fase final e que deixou o “Galo” muito próximo de levantar o título nacional, o que ocorreria poucos dias depois.


O timaço tricolor segue com um trio que começava, neste 1964, a escrever as primeiras páginas de suas gloriosas carreiras. Falo do inigualável lateral-direito Carlos Alberto Torres, capitão da Seleção Brasileira que conquistaria o Tri Mundial no futuro 1970, do incansável volante Denílson, implacável e de extrema eficiência a missão de proteger a retaguarda tricolor durante toda sua vida dentro das quatro linhas, e do perigoso ponta Gílson Nunes, que seria importantíssimo para o Vasco sair de uma fila de 12 anos sem títulos, em 1970, e para o América vencer a Taça Guanabara de 1974.


E como havia prometido alguns parágrafos acima, chegou a hora de falar do grande artilheiro do Cariocão 1964: Amoroso. Com 26 anos de idade, Amoroso se encontrava naquele período da carreira considerado por algumas teorias como melhor de um jogador de futebol, quando este não está tão jovem a ponto de a inexperiência atrapalhar, nem tão velho para ter problemas com o preparo físico. E mais: chegava ao Fluminense com o cartaz de Bi Carioca pelo Botafogo (61/62). Pois foi com toda esta maturidade que Amoroso se sagraria não só o artilheiro do Carioca de 1964, com 19 gols, como também no do ano seguinte, desta vez com 10 tentos.


Foi do próprio Amoroso, em uma cobrança de pênalti aos 5 minutos do 2º tempo, o gol que deu ao Fluminense a vitória no primeiro confronto decisivo da melhor de três. Mesmo com o caneco mais próximo das Laranjeiras, nenhum dos 75.106 pagantes para a segunda peleja seria capaz de bater o pé e, com a maior das convicções, afirmar quem seria o Campeão Carioca de 1964. Principalmente quando, aos 28 minutos da 1ª etapa, Bianchini abriu o placar para o Alvirrubro. Mas aí veio o intervalo e, com todo o seu imensurável conhecimento do esporte bretão, o treinador tricolor Tim, conhecido como “O Estrategista”, recolocou seus pupilos no caminho da glória. Foram nencessários menos do que dez voltas do ponteiro dos minutos para o Fluzão, gols de Joaquinzinho e Jorginho, virar o escore e colocar mais alguns dedos no caneco, que foi parar de vez nas Laranjeiras quando, aos 22 minutos, Gílson Nunes arrancou pela esquerda e marcou um golaço, “acabando com a vaidade de Moça Bonita”, como diria o lendário programa Canal 100.


Esta não seria a primeira vez que o Fluminense venceria o Bangu em uma finalíssima de Carioca. E nem a última. Em 1951, com dois gols de Telê Santana, e em 1985, ano em que recheou sua história com mais um Tri, o Flu deixaria os banguenses de cabeça inchada. Mas estas, meus amigos, são histórias para outras viagens...


Fluminense 3 x 1 Bangu

20 de Dezembro de 1964

Maracanã – Público: 75.106 pagantes

Gols: 1º tempo: Bianchini (BAN), aos 28’; 2º tempo: Joaquinzinho (FLU), aos 5’, Jorginho (FLU), aos 8’ e Gílson Nunes (FLU), aos 22’.

Fluminense: Castilho; Carlos Alberto Torres, Procópio, Valdez e Altair; Denílson e Oldair; Jorginho, Amoroso, Joaquinzinho e Gílson Nunes. Técnico: Elba de Pádua Lima “Tim”.

Bangu: Aldo; Fidélis, Mário Tito, Paulo e Nílton Santos; Ocimar e Roberto Pinto; Paulo Borges, Parada, Bianchini e Cabralzinho. Técnico: Plácido Monsores.

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