Brasil 3 x 0 Japão – Estádio Mané Garrincha, Brasília (DF)
Sem ser espetacular, o Brasil jogou bem, foi às redes com
rara beleza – que golaço, Neymar! – e deu a impressão de que a nova “Família Scolari”
deu um passo a mais na sua formação. Mas diante das sonoras vaias direcionadas pela
torcida a Presidente Dilma Roussef – tão sonoras que o Presidente da FIFA,
Joseph Blatter, chegou até a pedir respeito e “jogo limpo” – as análises
técnicas, táticas, físicas e psicológicas do que ocorreu nos 90 minutos
perderam espaço.
Uma vertente conhecida pelo termo reducionista classifica o
futebol como somente um agente alienante. Segundo ela, basta que a pelota
estufe o barbante para que o torcedor esqueça todas as mazelas que assolam o
país e os governantes, que teriam controle sobre a “ferramenta de dominação”
chamada futebol, ganhem carta-branca para dar sequência a uma estrutura social
hierarquizada onde eles, os governantes, estão sempre próximos ao topo. O
estrondoso apupo que ecoou pelo Estádio Mané Garrincha e acanhou Dilma a ponto
de a fazer querer se livrar do microfone o mais rápido possível durante o
discurso de abertura, mostra que reduzir o futebol somente a “ópio do povo” é
uma atitude que precisa ser refletida.
Roberto DaMatta, uma palavra que merece ser ouvida quando o
assunto é o papel social do futebol, clareou da maneira que lhe é peculiar a
relação entre Seleção Brasileira e alienação. Há exatos 15 anos, o antropólogo se
perguntava e se respondia: “Alienar como, se a imensa paixão é pelo Brasil?
Como alienar, se a densidade do elo torcedor-Brasil se faz justamente pelo fato
de o Brasil ser o que é: um país que só faz manchete internacional por suas
vergonhas? [...] Fosse o país uma Suíça em tamanho grande, a paixão seria por
outras coisas. Mas é o fato de o Brasil ser o que é e ter o que tem tido que
desperta tudo isso”.
Minutos antes do apito inicial no Mané Garrincha, a torcida
estava a imaginar o que viria pela frente. “O que estes japoneses podem
aprontar?”, se perguntavam uns. “Eles já estão garantidos na Copa do Mundo”, lembravam
outros. “Estreia é sempre perigoso”, alertavam. Isto não é alienação, é viver o
momento. Como se vive um momento íntimo de casal, um filme no cinema ou um
livro na varanda de casa. Aí, surge no telão, de microfone em punho, a
Presidente do Brasil. Naquele momento, para a maioria dos presentes, ela
representava as condições precárias de saúde, educação e transporte, o aumento
no preço dos alimentos, a falta de segurança... Livres de um suposto ópio, os
torcedores soltaram as vaias. Justamente no estádio que custou mais de 1,5
bilhão aos cofres públicos.
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